A habitação é essencial na vida do ser humano. Estudos mostram que o indivíduo precisa abrigar-se para desenvolver a sua energia de trabalho. A moradia digna surge como uma das necessidades mais básicas, elevando a autoestima e a melhora da saúde física e mental.
A falta da casa própria para as famílias de menor renda aumenta as desigualdades sociais empurrando-as para a periferia onde os terrenos são mais baratos, dificultando o transporte ao trabalho e o acesso à infraestrutura urbana consolidada.
Segundo dados da Fundação João Pinheiro, em 2015 tínhamos um déficit habitacional de 5,6 milhões de moradias e em 2021 de 5,9 milhões, o Brasil não está conseguindo reduzir este déficit.
Hoje, na maioria dos municípios, a legislação é ultrapassada. Mesmo nas reformas dos planos diretores são mantidos os conceitos urbanísticos do passado e são criadas novas exigências que encarecem a produção imobiliária impedindo o acesso à moradia digna às famílias de menor renda.
Compare com automóveis. Imagine se a legislação impusesse que todos os veículos tivessem ar condicionado, banco de couro, direção elétrica e câmbio automático. Elevaria o padrão do produto, mas também elevaria o preço de venda e os consumidores de menor renda ficariam alijados da possibilidade de adquirir um automóvel devido a regulação excessiva.
O legislador público, principalmente o municipal, na boa intenção de qualificação urbanística e conforto ao usuário, o prejudica de forma brutal, pois impossibilita o mercado de oferecer alternativas de padrões mais econômicos: é o Robin Hood às avessas!
Segundo SECOVI-SP, na Região Metropolitana (RMSP), em 2015 o município de São Paulo lançou 60% das unidades habitacionais e os 38 municípios da Região Metropolitana (RMSP) lançaram 40%. Em 2020, São Paulo respondeu por 92% das ofertas de habitação e o restante da RMSP por apenas 8%. Como ocorreu esta transformação?
São Paulo é uma exceção, fez uma “revolução” no seu Plano Diretor, eliminando antigas regras e as contrapartidas que impediam a produção de habitações em preços mais acessíveis. Exemplos: suprimiu-se a exigência de vagas de garagem; permitiu-se a redução das áreas das unidades e hoje, 50% das moradias lançadas tem entre 25 e 40 m²; permitiu-se maior ocupação do terreno quando tem comércio no projeto, etc.
Os municípios podem ajudar muito, simplificando processos para redução dos prazos e modernizando a legislação nos moldes realizados pela cidade de São Paulo. Este modelo gerou muita concorrência entre os incorporadores e os obrigou a dar soluções criativas para terem seus produtos aceitos pelos adquirentes. Atenderam a real necessidade das famílias prevalecendo sobre o “achômetro” dos legisladores “protetores” de outros municípios da RMSP.
Com os progressivos aumentos dos custos de materiais e a valorização da mão de obra da construção superando a evolução dos salários, estão surgindo muita dificuldade na aquisição da casa própria e ainda existe um monstruoso agravante, que é a entrada de 20% do financiamento imobiliário. É preciso voltar para 10% como era no passado pelo FGTS.
Somadas, estas situações estão levando a habitação popular para o precipício. Em 2010 foram construídas 666 mil casas com recursos do FGTS (moradia popular) e em 2021 caiu para 367 mil. É mais que latente que a habitação popular pede socorro.
A salvação está nas três esferas de governo e as mudanças precisam ocorrer. Os municípios estão mais próximo de nós, vamos acioná-los, eles não vão “lavar as mãos”. Vamos encarar o problema de frente, com racionalidade e foco na solução.
Rafael Coelho
rafael.coelho@citz.co
Diretor da Regional do SindusCon-SP
Diretor da Citz Desenvolvimento Imobiliário